
A cafeína está presente no dia a dia da maioria das pessoas: no café da manhã, no chá da tarde, naquele chocolate da sobremesa ou até nos remédios para dor de cabeça. É a substância psicoativa mais consumida no mundo — e não é por acaso. Ela melhora a concentração, dá um “up” na energia e ajuda a espantar o sono.
Mas será que a cafeína pode afetar a fertilidade ou a saúde reprodutiva da mulher?
O que dizem os estudos
Embora não exista uma prova definitiva de que o consumo moderado de cafeína cause problemas de fertilidade ou prejuízos na gravidez, muitos estudos apontam possíveis riscos, especialmente em níveis mais altos de consumo.
A preocupação principal vem do fato de que a cafeína atravessa facilmente a placenta e se acumula nos tecidos do feto. Como o metabolismo do bebê é muito imaturo, ele demora muito mais para eliminar a substância do corpo. Ou seja: o que pode parecer uma dose pequena para a mãe, pode ser significativa (e prolongada) para o feto.
Durante a gestação, o metabolismo da cafeína na mãe também desacelera. No terceiro trimestre, por exemplo, o tempo para o corpo eliminar a substância pode triplicar. Isso aumenta ainda mais o tempo de exposição fetal.
Além disso, a cafeína pode interferir nos níveis hormonais, aumentar substâncias inflamatórias no corpo e até reduzir o fluxo sanguíneo para o útero — o que, teoricamente, pode afetar a saúde reprodutiva.
Mas… os estudos são confiáveis?
É importante saber que estudar os efeitos da cafeína na saúde reprodutiva não é uma tarefa simples. A maioria dos estudos disponíveis têm limitações importantes, o que dificulta tirar conclusões definitivas.
Alguns problemas comuns incluem:
- Dificuldade em medir com precisão o quanto de cafeína as pessoas consomem (por exemplo, uma xícara de café pode ter de 72 a 130 mg, dependendo da marca, método de preparo e tamanho);
- Muitas pessoas esquecem ou subestimam o quanto consomem, o que gera um viés nos resultados;
- A cafeína não é a única substância presente no café, chás e chocolates — outros compostos também podem interferir nos resultados;
- Fatores como estresse, fumo, álcool, alimentação e até sintomas como enjoo durante a gravidez influenciam os estudos e nem sempre são bem controlados nas pesquisas.
Um exemplo clássico de viés é o chamado “sinal de gravidez”: mulheres que têm enjoos no começo da gestação geralmente reduzem naturalmente o consumo de café — e essas mesmas mulheres tendem a ter gravidez com desfechos mais positivos. Isso pode dar a falsa impressão de que reduzir a cafeína melhora a gestação, quando, na verdade, o enjoo é um reflexo de uma gravidez saudável.
Então, o que fazer?
Diante de tanta incerteza, a melhor recomendação é a moderação. Especialmente se você:
- Está tentando engravidar
- Já está grávida
- Tem histórico de abortos espontâneos ou dificuldades reprodutivas
- É sensível aos efeitos da cafeína (como insônia, taquicardia, ansiedade)
A maioria dos especialistas recomenda limitar a ingestão a no máximo 200 mg de cafeína por dia durante a gravidez — o equivalente a cerca de duas xícaras de café coado ou uma dose de espresso. Mas lembre-se de que refrigerantes, chocolates, energéticos e até alguns medicamentos também contêm cafeína.
Conclusão
A cafeína, em doses moderadas, provavelmente é segura para muitas mulheres em idade reprodutiva. Mas, para aquelas que estão em fases mais sensíveis como a gestação ou tentativas de engravidar, o ideal é ter cautela e buscar orientação médica.
Cada organismo é único — e o equilíbrio é sempre o melhor caminho.
REFERÊNCIAS
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